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Transitoriedade em Freud

Transitoriedade em Freud

Nesse artigo recordamos o que Freud escreveu sobre a transitoriedade:

… O poeta admirava a beleza do cenário à nossa volta, mas não extraía disso qualquer alegria. Perturbava-o o pensamento de que toda aquela beleza estaria fadada à extinção, de que desapareceria quando sobrevivesse o inverno, como toda a beleza humana e toda a beleza e esplendor que os homens criaram ou poderão criar. Tudo aquilo que, em outras circunstâncias, ele teria amado e admirado, pareceu-lhe despojado de seu valor por estar fadado à transitoriedade… (FREUD, 1996f, p. 317).

Ao constatarmos que existe uma limitação no tempo da existência dos objetos (pessoas e coisas) e que todo o afeto que investimos nesses (os objetos que amamos e admiramos e mesmo o que não nos afeiçoamos) converte-se em nada sob a atuação do tempo, concomitantemente, também constatamos que estamos todos fadados à aniquilação.

Freud convida-nos a refletir sobre a fugacidade de tudo que existe e afirma que esta constatação nos aponta para dois caminhos:

  1. A transitoriedade ligada ao conceito de perda, destruição e morte, isto é, podemos tanto nos desiludir e evitarmos relacionarmos com os objetos (pessoas e coisas) por acreditarmos não haver sentido para esse envolvimento, já que esse por sua vez se dá de maneira provisória;
  2. Como ao contrário, transitoriedade como conceito de mudança, transformação, expectativa, esperança, ou seja, o fato de algo ser raro torna-o ainda mais valioso e convidativo ao nos relacionarmos, digno de apreciação e investimento afetivo.

Se discorrermos pelo ponto de vista pessimista do poeta citado acima por Freud, pensaremos que a impermanência dos objetos os tornam menos valorizados. Como se os objetos, pessoas e coisas de alguma maneira, deveriam ser capazes de transpor a todas as possibilidades de destruição. Esta ilusão de imortalidade é fruto dos nossos desejos. Sendo que muitas vezes esta pretensão de controlar a ação do tempo e durabilidade é o que norteia o valor que damos as coisas e pessoas, o quanto vamos nos dedicar a esses objetos, o que esses podem nós garantir a titulo de tempo e durabilidade. Não havendo possibilidade de realização deste desejo de imortalidade e permanência, torna-se penoso o convívio com esta falta de controle diante da real fatalidade.

Visto de uma maneira mais positiva como propôs Freud, “o valor da transitoriedade é o valor da escassez do tempo” (Freud, 1996f, p. 317)

A transitoriedade dos objetos (pessoas e coisas) pode ser interpretada como algo exclusivo, único, a que se queira investir no momento em que podemos desfrutar deles, estando subtendido aí a idéia do tempo presente.

Poderíamos conjecturar que para Freud, a escassez no tempo é o que conota o valor aos objetos. A singularidade de um momento, de um objeto (pessoas e coisas), é o que dá importância e sentido para promovê-lo. Sendo assim, o valor das coisas não está enlaçado à sua duração, mas ao significado que o sujeito define de acordo com o momento de sua vida. Dando sentido a sua vida sentimental/afetiva através da capacidade de construção e reconstrução constante no eterno presente.

Seguindo essa linha de raciocínio poderíamos supor que o sofrimento psíquico está armazenado na memória do passado ou na imaginação do futuro. Sendo que o único momento real é o presente, é nele que reside a eternidade, a qual não sabe vivenciar, pois há sempre um fator emocional presente conturbando o discernimento.

Portanto, a forma que cada sujeito entende e vê o mundo, o significado e importância que se dá aos objetos (coisas e pessoas) depende da nossa vida emocional, que por sua vez é atemporal.

 

Lucimara Cadorini

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